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Foto do escritorRedação | Vision Surf |

Talento, foco, fé e glória!

Atualizado: 6 de fev. de 2021

Em 2014, após 38 anos de supremacia da língua inglesa no surfe, pela 1ª vez um campeão não tinha o inglês como língua mãe, a vitória de Gabriel Medina extirpou em definitivo o complexo de vira-lata do surfe brasileiro, munidos de sangue nos olhos e facas nos dentes, em 2015 nossos atletas começaram o ano com o desejo de provar que a geração Brazilian Storm não se resumia a Gabriel Medina, 2015 foi o ano em que o surf brasileiro descobriu que poderia ir além, foi o ano que o surfe brasileiro dominou todas as categorias internacionais, a vitória de Gabriel solidificou o sonho de uma geração e construiu uma mente vencedora em nossos atletas, além de, mostrar a Adriano de Souza que ele poderia cumprir sua missão de vida, e para Capitão Nascimento, missão dada é missão cumprida, para não estender muito, vimos uma cena que nem o mais otimista torcedor previa, um brasileiro entregando o troféu de campeão mundial para outro brasileiro, algo que surfistas de gerações anteriores jamais imaginaria, além de Gabriel entregar o troféu para Adriano, tivemos as primeiras vitórias de Filipe Toledo (Gold Coast, Rio de Janeiro e Portugal), o que nos dava a certeza de termos mais um potencial campeão mundial, vimos também um nome completamente novo entrando na elite, um cara que chegou de forma meteórica, mas que poucos conheciam, seu nome? Ítalo Ferreira!

Itálo Ferreira conquistou o título mundial de surfe (Foto Ed Sloane WSL)

Ítalo chegou na elite do surfe mundial e logo de primeira ganhou nossa admiração, sua história por si só já nos impunha isso, ele é o típico cabra da peste, o menino do interior do Nordeste, de família humilde, que agarrou a única oportunidade que tinha, e que, de cara via-se nela mais gana do que em seus adversários que também ingressavam na elite aquele ano, Wiggolly Dantas, Matt Banting e Keanu Asing, isso é tão verdade que logo em seu ano de estreia ele fez final em Portugal e sagrou-se rookie of the year, ao longo dos anos, a medida que todos os outros foram caindo para o WQS, Ítalo procurou corrigir as deficiências de seu surfe e quatro anos depois de ingressar na elite, ele tornou-se campeão mundial, e mais uma vez vimos uma cena que até 2014 era inimaginável, um brasileiro entregando o troféu de campeão mundial para outro brasileiro, mas isso é um assunto para depois.

Quando chegou na elite em 2015 Ítalo tinha muitos pontos fortes em seu surfe, como o jogo aéreo, manobras fortes e progressivas, base lip, tubo, enfim, era um surfista de elite realmente, além de fazer final em Portugal Ítalo fez bonito em Fiji ficando em 5º lugar, vencendo nomes como Joel Parkinson e Kelly Slater, parando apenas em Julian Wilson, o australiano fez 17.36, ítalo fez 17.00, o mar estava gigante e o estreante mostrou muita atitude. Em Teahupoo, mais uma vez com ondas de consequência ele fez outra 5ª colocação, parando em Owen Wright, mas até chegar lá o garoto fez um estrago, sua maior vítima foi Filipe Toledo, ele venceu o ubatubense por 15 a 0, inacreditavelmente Filipe saiu da bateria sem pegar uma única onda, ao final desse ano, o desconhecido Ítalo foi coroado o estreante do ano, e, a essa altura ele já era observado de perto pela Billabong, que geralmente costuma formar seus atletas, mas que, com a previsão da aposentadoria de Taj e os anos ruins de Parko, precisava de um novo nome com potencial para tentar voltar ao topo do mundo, então, em meados de 2016 a Billabong assinou com Ítalo motivada pala expectativa de voltar a ser campeã mundial.

Ítalo Ferreira com a taça de campeão (Kelly Cestari/Getty)

Passado o ano de sua estreia, 2016 e 2017 foram anos de aprendizado, havia em Ítalo alguns pontos a serem corrigidos, surfe muito picado, excesso de vontade que por vezes determinou derrotas, além de uma notória inconsistência, em 2016 ele fez duas semifinais, no mais, foi um festival de 13ª colocações, contudo as semifinais foram suficientes para lhe garantir a 15ª colocação ao final do ano, em 2017 ele se machucou e ficou três etapas fora, mas ainda assim conseguiu se reclassificar através do próprio tour, e entre a temporada de 2017 para 2018, Ítalo trabalhou duramente nas correções que precisava para chegar realmente a seu objetivo, Ítalo foi o atleta da elite que mais evoluiu entre essas temporadas, de longe. 2018 chegou e Ítalo estava completamente recuperado de suas lesões, de bem com o surfe, com a vida, bem patrocinado, havia chegado o momento de ele começar a construir sua história, e que momento, ítalo escolheu o caminho mais difícil e tortuoso para um goofy brilhar, ítalo escolheu um dos palcos mais icônicos da história do surfe, onde em 1981 Simon Anderson chocou o mundo ao chegar na praia para competir usando um novo modelo de prancha com três quilhas, ao invés de duas, o que era “normal” à época, não apenas, Ítalo escolheu o reino dos regulares, onde Kelly Slater e Mick Fanning venceram quatro vezes cada, falando de Mick, Ítalo resolveu brilhar no dia da despedida do maior gentleman que o surfe já conheceu, o roteiro escrito naquele dia terminaria com a quinta vitória de Mick na mítica onda, faltou apenas combinarem com Ítalo Ferreira, sim, depois de tudo isso é desnecessário, mas vamos falar, Ítalo escolheu brilhar na 56ª edição de Bells Beach, a competição mais antiga do calendário do surfe mundial, onde apenas Adriano de Souza e Silvana Lima como representantes de terras tupiniquins haviam tocado o famoso sino. A vitória em Bells na despedida de Mick parecia certa desde o começo, ítalo ia nocauteando seus adversários uma a um, dentre eles Filipe Toledo e Gabriel Medina, para ao final ser eternizado na despedida do aussie, essa foi sua primeira vitória, vitória maiúscula de alguém que sabia ter conseguido algo raro, algo que poucos goofys conseguiram ao longo de 56 edições, essa vitória lhe rendeu a confiança necessária para atacar a liderança e tornar-se um dos candidatos a campeão mundial.

Ítalo seguiu amadurecendo e vencendo em 2018, em Keramas esquartejou as direitas como se estivesse na BF, em Portugal usou toda sua versatilidade em várias condições diferentes vencendo não somente a competição como todas as desconfianças, se é que ainda existiam algumas naquele momento, porém, mesmo vencendo três etapas ele chegava no Havaí sem condições de título.

Amarradão por vencer três etapas no ano, mas ressabiado por não ter chances de título, em 2019 Ítalo resolveu mudar o roteiro, buscou competir com maior inteligência, passou a viajar com uma personagem que parece ter sido fundamental e mudado seu foco, sua namorada Mari Azevedo, ela parece ter trazido conforto emocional e equilíbrio, somado ao talento explosivo de Ítalo, resultou em um aproveitamento poucas vezes visto, cinco finais de onze possiveis, e, consequentemente o título mundial, sim ITALO É O CHAMP.

Más em 2019 nem tudo foram flores no caminho do champ, só o Jeremy, que aliás veio com espinhos, o ano começou e agora ao final podemos dizer que foi um ano de fases, no primeiro momento o Cabra da Peste de Baia Formosa assumiu a liderança do circuito com a vitória em Durambah, após um vacilo fenomenal do eterno vice Kolohe Andino, na etapa seguinte Ítalo defendia o título de Bells e vinha surfando tão bem como o ano anterior, liderava sua bateria, más em uma interferência boba ele acabou cruzando Jordy e voou nas quartas de final, perdendo a chance de continuar líder, desse momento em diante John John Florence assumiu a liderança e aplicou uma gordura animal sobre seus adversários, até Saquarema chegar e ele abandonar o circuito mais uma vez, nesse momento, começou a segunda fase, todos os caras que vinham como TOP5 (Kolohe, Filipe, Ítalo, Jordy e Igarashi), além de Gabriel Medina que na ocasião vinha na 10ª colocação, vislumbraram a chance do título. Nas etapas seguintes Kolohe e Filipe usaram a lycra amarela, até Teahupoo chegar e Gabriel Medina assumir a liderança, começando a terceira fase do ano, voltando a ideia do princípio, voltamos a ter a possibilidade de fecharmos o ano com um tricampeão, só que dessa vez o cara era brasileiro, Gabriel continuou reinando no Surf Ranch, más ao chegar na Europa mais líder que nunca e parecer realmente ser o dono da competição, eis que Ace Buchan venceu-o nos tubos da França e Caio Ibelli venceu Gabriel em sua distração portuguesa, ora pois.

Ítalo que já havia chegado à final na França, começou uma corrida insana em busca do caneco em Portugal, e, de aéreo em aéreo, no dia final Ítalo venceu Jack Freestone, Caio Ibelli e seu adversário direto na briga pela liderança, Jordy Smith, o brasileiro voou direto da 3ª posição para a liderança ranking, nesse momento deu-se início a 4ª fase do circuito em 2019.


Embora tivesse feito uma perna europeia perfeita e estivesse líder, ainda assim Ítalo não era considerado favorito para o título, isso porque Gabriel Medina precisava ficar apenas um round à frente dele no Havaí, considerando os resultados de Gabriel em Pipe e sua conhecida fome competitiva não era difícil concluir que Gabriel tinha o favoritismo, más surfe não se faz só de retrospecto e competitividade, existem outras variantes que podem mudar o rumo daquilo que é preestabelecido, treinamento, foco, planejamento e fé são ingredientes que não podem ser desconsiderados.

Ítalo chegou com bastante antecedência no Havaí, treinou forte, sempre auxiliado pelo mestre Shene Dorian, além do crazy local Jamie O´Brien, foi acolhido pela comunidade havaiana, tinha toda a torcida local ao seu favor, mas quando a competição começou parece que nada disso surtia efeito, ítalo não dava sinais que sairia do Havaí com o troféu, nos dois primeiros dias de competição sua maior nota foi um 6.17, em sua primeira bateria passou em segundo e na bateria contra Jadson sua maior nota foi um 4.60, somando incríveis 8.53, para sua sorte, Jadson fez sua pior apresentação em Pipeline da carreira, somando meros 7.20 pontos.

Alheio a tudo isso vinha Gabriel Medina, ele parecia imbatível, imparável, Gabriel nocauteou todos os seus adversários nos dois primeiros dias, sempre com somatórias superiores a 17 pontos, no dia final o show continuou e ao encontrar o havaiano John John Florence, todos achavam que Gabriel tinha poucas chances de avançar, já que enfrentaria o outro bicampeão, o cara que nasceu ali, que aprendeu a surfar ali, que conhece o M³ daquele line-up melhor que qualquer outro, mas que, nada disso foi suficiente para parar aquele que menos treina em Pipe, Gabriel Medina, o brasileiro fez sua maior pontuação na competição nesta bateria, 17.63, deixando seu rival em combinação, Gabriel dava a impressão que ele e Pipeline não apenas coexistiam, mas sim, se completavam.

Já Ítalo, no dia final foi crescendo à medida que ia passando, fez um somatório melhor contra Peterson Crisanto, chegou na sua melhor pontuação (15.66) no melhor momento do mar surfando contra Yago Dora, ao passar por Yago ele já fazia sua melhor competição da carreira em PIpe, e, na sequencia acabou com o sonho olímpico do unodecacampeão Kelly Slater, Kelly entrou no heat com um único foco, o BackDoor, pela porta de trás ele já havia feito a nota máxima da competição, um 10 perfeito, e havia também vencido o Jack Freestone de virada faltando trinta segundos para o termino da bateria, Kelly é realmente um ET, um bruxo, um hipnotizador, Kelly é o demônio, Kelly é Deus... Kelly é Kelly, um cara que quando dropa para o BackDoor parece encontrar o elixir da juventude e das vitórias, más, ao menos dessa vez seu contrato com Netuno parece que foi rescindido, a direita abrindo não entrou na bancada, enquanto Ítalo seguia trocando nota atrás de nota, e para finalizar, Kelly saiu ao estilo leão da montanha, de comb pela esquerda, os coroas entenderão!


Ítalo saiu do mar completamente pilhado afim aguardar seu adversário para sua primeira final em Pipeline, viu Gabriel avançar contra Griffin para decidir com ele o título de campeão mundial, na última bateria da última etapa, Ufa... enfim o título mais disputado da última década chegava em seu derradeiro momento decisivo.

Ao tocar a sirene da final Ítalo começou a bateria de sua vida, foi mais agressivo na remada para a primeira onda, mas ficou fora do pico caso acontecesse novamente tudo que tinha acontecido durante o dia, caso entrasse as esquerdas, más todo campeão precisa também de acasos e sorte, Netuno que tinha segurado as direitas para Kelly, soltou um direitão bem encaixada na bancada para a primeira onda da bateria, e, Ítalo que estava por dentro, colocou pressão na remada, entrou atrasado, fez um boton turn, algo inédito para o BackDoor, encaixou no trilho, passou duas grandes seções, saiu na baforada recebendo um 7.83, Ítalo abriu a bateria com a moral de quem não perderia aquele confronto nem para seu pior adversário, a ansiedade, quiçá Gabriel Medina, que embora seja o maior vencedor de baterias no atual circuito, é de longe o cara que mais perde para Ítalo, eu diria que Ítalo está para Gabriel como a kryptonita está para o Superman. Já com uma nota de respeito, sob a prioridade de Gabriel, ítalo pegou sua backup wave em uma onda para Pipeline que parecia ruim, mas, ela abriu e ele anotou outra boa nota, Ítalo foi fazendo a bateria e colocando volume, enquanto Gabriel esperava a onda da série com o swell baixando, quer saber o resultado disso?

O cara que começou vencendo na abertura do circuito, o cara que se perdeu no meio e chegou a passear pela quarta colocação, o cara que já no finalzinho fez uma perna europeia perfeita com uma final na França e uma vitória em Portugal, o cara que fez cinco finais no ano, o cara que desbancou o favorito sem nenhuma subjetividade na bateria decisiva, esse cara sagrou-se campeão mundial e Pipemaster, Parabéns ITALO FERREIRA, você foi um gigante e colocou seu nome na galeria dos melhores do mundo de todos os tempos, não apenas pelo título, más também pela vitória da raça em Pipeline, alguns já foram campeões mundiais, más pouquíssimos foram campeões mundiais e Pipemasters, Tom Curren, Mick Fanning e John John Florence não conseguiram essa combinação, se orgulhe de seu feito, pois nós, não cabemos mais dentro de tanto orgulho, o ano acabou, más o orgulho continua, mais uma vez, parabéns Ítalo, você pavimentou o caminho que caras como Filipe Dantas, Joca Junior, Aldemir Calunga, Danilo Costa, Marcelo Nunes, Jadson André e outros abriram, o Rio Grande do Norte agradece, o Nordeste agradece, o Brasil agradece, foi grande, foi lindo.

Parabéns também a Gabriel Medina, que chega mais uma vez ao final do ano na disputa pelo título, e, também o Filipe Toledo, que mesmo se despedindo cedo da briga, mostrou que vem evoluindo e muito no Havaí. Aguardo ansiosamente o retorno de Miguel Pupo, um cara com surfe de elite que voltou para a elite, 2020 provavelmente será o ano mais disputado do circuito mundial, Kelly não deve parar, John John, Gabriel, Adriano e Ítalo competirão com faixas de campeões mundiais, Julian e Jordy devem acelerar o passo enquanto podem, Filipe Toledo deve vir enfurecido por ter perdido o título e a vaga olímpica, nomes como Griffin Colapinto, Ethan Ewing e Seth Moniz devem assumir posições de destaque, e G-Land volta ao tour depois de mais de duas décadas ausente, antes tarde do que nunca. Mais uma vez é preciso dizer, obrigado ITALO FERREIRA, obrigado SURFE BRASILEIRO, em meio a tantos exemplos ruins que o Brasil tem nos dado quase que diariamente, vocês nos enchem de orgulho e alegria.

Nós somos a maior potência do surfe no planeta!

Até 2020!



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