O Surf Ranch foi apresentado ao mundo pelo unodecacampeão e maior ídolo do surf há poucos anos, em mais uma importante contribuição do tio Kelly para o esporte que ele é o Deus, cercado de mistérios e quase nenhum registro, Kelly reuniu a elite do surf mundial afim de ouvir a opinião dos tops sobre a onda em um evento “teste”, evento esse carimbado pela WSL mas sem valer pontos para o circuito, dizem por ai que foi um sucesso, Gabriel Medina venceu e Filipe Toledo ficou em segundo, só quem estava lá, sabe como foi. Superado as expectativas sobre a qualidade das ondas, a WSL tratou logo de colocar a piscina no calendário oficial do circuito mundial no ano seguinte, resultado?
Gabriel Medina campeão e Filipe Toledo vice novamente. Não pelo resultado e muito pelo formato, que começava dos piores classificados para o melhor, tudo parecia ser um déjà vu, os surfistas do fundão pareciam robôs usando o mesmo chip, duas batidas um cutback, duas rasgadas uma passada de floater, uma batida e um tubo pra finalizar, esse roteiro minimalista e programadinho só mudou quando Gabriel Medina entrou na água no final do segundo dia de competição, até chegar lá foi chato realmente, para quem assiste, já para quem surfa certamente é adrenalina pura, a onda é rápida, linda e perfeita, te transmite confiança, e, quando você confia nela, ela vai lá e te derruba no tubo, ou te pede uma rabetada, fazendo você perder tempo e consequentemente a corrida, isso acontecia tanto, que ficou realmente enfadonho de assistir, más não se pode negar, a culpa não é da onda, faltou criatividade no approach da surfistada, as exceções foram Jordy, Filipe e Gabriel, a WSL percebeu, repensou o formato, mudou e 2019 começou com tudo diferente, más terminou de forma igual.
Depois de sua precoce eliminação em Teahupoo parece que Kelly chegou no Surf Ranch menos humorado que o ano passado, sorte de Filipe que surfou sem a pressão branca do tio, azar dele mesmo, que não conseguiu se classificar para os oito finalistas, más mesmo perdendo, quando se trata de surf na agua, Kelly ainda tem muito a nos ensinar, ele é o mestre dos mestres, na primeira rodada de sua primeira bateria ele foi muito mal, na segunda o Careca inventou uma biquilha com estabilizador, mudou completamente a velocidade, mudou o surf, mudou o “time” das manobras e conseguiu se classificar para o dia final, embora no dia final ele não tenha conseguido avançar.
Resumindo a passagem de kelly, na onda que ele fez para seu show particular, seu maior show esse ano foi entender o equipamento certo para a situação certa, nenhum outro surfista “de todas as outras gerações” ousaria tanto com equipamento, Kelly é o mestre.
O dia final começou com Gabriel Medina na liderança desde sua primeira onda surfada, com a mudança no formato a competição ficou mais dinâmica, as expectativas para os brasileiros aumentaram e todos estavam de olho naquilo que Filipe Toledo, então líder do circuito poderia aprontar para o líder da competição, não se pode negar que Gabriel seja o mais completo, más também não se pode negar que o surf de Filipe seja “em tese” aquele que mais se encaixa às ondas mecânicas do tio Kelly, tio Kelly que, no esboço do projeto desenhou uma esquerda cheia e “fácil de manobrar” com um tubo relativamente rápido para quem vem de back, já a direita com dois tubos velozes e furiosos, o veloz no meio da onda, o furioso no final dela, duas armadilhas perigosíssimas para quem vem de back, sim, a piscina foi feita para regulares, só esqueceram de combinar esse enredo com Gabriel.
Filipe pelo segundo ano consecutivo deu um show nas direitas, aplicou todo o seu repertorio progressivo com rabetadas e aéreos, foi além, mostrou mais uma vez que, caso o tubo chegue no meio da onda ele vai completar, até com uma certa segurança e talvez muito estilo, más, ser extraordinário nos fundamentos considerados “zona de conforto” e normal nos outros, dificilmente levará o atleta ao apogeu, no caminho para vitorias e consequentemente para o título, o mínimo que um atleta profissional deve buscar é equilíbrio, equilíbrio é a solução, metaforicamente falando, na balança de Filipe a bandeja da direita está repleta de pesos que a bandeja da esquerda não tem, e, pelo segundo ano seguido ele não consegue fazer uma nota oito nas esquerdas, vale lembrar, em ondas de três pés. E olha que ainda dizem por aí que a onda é previsível, uma previsível mais rápida que a velocidade do Filipe, um monstro que de esquerdas perdidas em esquerdas perdidas, chegou mais uma vez na segunda colocação, onde em tese ele seria o grande favorito, Filipe precisa buscar outras habilidades além da chamada progressividade.
Mais uma vez o Surf Ranch foi uma etapa importante para Filipe Toledo, ele só não vê se não quiser, o que lhe sobra nas direitas lhe falta nas esquerdas, se bem que, eu acho que ele ainda não pôde olhar para ele mesmo, o jovem promissor está sempre olhando para si através da ótica de terceiros... Entendedores Tolederão... ops.. ato falho, entendedores, entenderão. Já Gabriel Medina parece distante de todas essas coisas de ser muito bom nisso ou precisar melhorar naquilo, de ser bom em tubos e precisar melhorar em manobras, de ser o rei de Teahupoo e precisar mostrar que pode vencer em J-bay, de dúvidas sobre conseguir vencer na piscina e também em Pipeline, enfim, Gabriel vive em seu mundo particular, onde só ele é capaz de determinar seus resultados, ele está sempre vencendo seus adversários, e, quando perde, na maioria das vezes perde para ele mesmo, como foi por exemplo a sua derrota na final de Teahupoo, em resumo, Gabriel consegue manter em qualquer condição o tal equilíbrio, Gabriel tem um parafuso a mais ou a menos, que determina sua força mental, combustível de seu surf.
Ao colocar o pé na prancha em sua primeira onda ele recebeu um 8.27, foi para a direita e mais uma vez recebeu 8.27, fazendo a maior somatória da rodada, ao voltar, depois de ter feito a melhor esquerda do dia ele conseguiu melhorar ainda mais seu somatório, fez um 8.77 com direito a aéreo reverse e 360 no meio da onda, vencendo mais uma vez ele mesmo nas esquerdas, foi para a direita e fez um 9.0, ao final dessa rodada já com os 36 surfistas tendo apresentado sues acenais, Gabriel se manteve líder desde o primeiro momento, ele seria líder mesmo com as notas de descarte. A primeira fase terminou com Gabriel em primeiro, Filipe em segundo.
Caras que chegaram na zona de classificação calangando como Owen e Julian, no dia final começaram ON FIRE, Owen arrancou duas notas excelentes (8.70+8.63) em suas primeiras ondas, Julian inovou completamente na esquerda e fez a maior nota até então (9.33), somando na direita (6.0), os outros caras que surfaram antes de Gabriel foram o Colapinto (8.17+8.27) e Filipe (7.70 + 9.63), todos entraram para decidir, só que, quando todo mundo pensa que colocou Gabriel nas cordas, ele vai lá e nocauteia a todos, qualquer um que ouse vencê-lo, sem muito esforço, isso parece que ficou visível.
Quando todos achavam que seria muito difícil o champ fazer a mesma somatória do round anterior, principalmente pelo fato de seus adversários terem entrado muito melhores, ele que havia feito 17.77, em apenas cinco minutos fez 18.86, com a tranquilidade e frieza que lhe é habitual, quando todos nós pensávamos que ele poderia sentir a pressão, ele mostrou mais uma vez que pressão enche seu tanque e lhe dá autonomia, Gabriel Medina mais uma vez venceu no Surf Ranch sem precisar entrar na agua na última rodada, mais uma vez venceu com sobra, mais uma vez com Filipe Toledo na segunda colocação. Filipe que na rodada final entubou de base trocada na esquerda e na direita desfilou toda sua elegância em um down the line que me fez lembrar Rob Machado.
No feminino, depois de entrar na final por muito pouco, Lakey Peterson foi crescendo e alcançou sua melhor forma em suas duas últimas ondas, vale lembrar que a Johanne Defay liderou até os 45 do segundo tempo, Lakey foi a única surfista a vencer duas etapas esse ano, ainda assim a liderança continua na mão de Carissa Moore.
Algumas observações:
- Kolohe e Kanoa estão descendo a ladeira;
- Jordy parece já está sem forças para reagir;
- Owen vem na crescente, pode ser o vice no final do ano..rs;
- Ítalo continua competitivo embora tenha perdido cedo, ficou claro que ele ainda precisa melhorar seu frontside de manobra, único ponto fraco de seu surf, se ele conseguir evoluir seu front como evoluiu seu backside, chegará mais forte para a briga pelo título;
Griffin parece estar completamente recuperado e pronto para ser o americano de destaque no tour;
- Yago é completo, más não sabe disso, fez um tubo de back absurdo, surfou na borda, fez base lip impecável, más ainda se permite ser muito dependente de aéreos;
- A Courtney foi exuberante, assumiu riscos, inovou, desgarrou, rabetou, meuteu estileira nos botons preparatórios para tubos, fez o surf mais bonito que o Surf Ranch viu, mas a juizada gosta da Carissa.
- Jeremy é sincero, muito sincero, más as vezes parece rabugento, declarou no ar: É difícil levar esse evento a sério.
Ao contrário do que muitos dizem por ai, esse colunista não acha a piscina chata, ela exige o máximo de cada um, na impossibilidade de avançar, muitos caras como Jeremy mudam o foco para esconderem suas deficiências, outros dão o máximo e nem assim conseguem entender aquela onda, a piscina expõe tudo, por isso muitos não gostam, tenho ouvido muita gente falar mal da onda do kelly, mas vejo inúmeros pontos positivos, é importante dizer que ela pode chegar onde os oceanos não chegam, popularizando ainda mais o esporte e crescendo a economia em torno do mesmo, meu amigo Henry Lelot defende que a repetição que a onda proporciona pode trazer evolução, pois repetição é a base para o aprimoramento técnico, com foco em alto rendimento, além disso, é bom lembrar também que é muito melhor ver a piscina do que dias de competições no mar como os dias finais da Gold Coast e Saquarema esse ano, Portugal o ano passado, e muitos outros dias péssimos que assistimos no mar, essa onda não vai substituir as ondas dos oceanos, contudo vai nivelar as condições, em igualdade de condições o melhor surfista sempre se sobressairá.
Ainda sobre os pontos positivos da piscina, nós brasileiros deveríamos ama-la, três competições já aconteceram ali com três vitorias de Gabriel, o que nos leva a acreditar que Kelly Slater foi quem construiu, más o verdadeiro dono é Gabriel Medina.
Quando o circuito voltar para o oceano a França será o palco, façam suas apostas para o vice-campeonato, já que, para campeão, em virtude dos últimos anos, é difícil não apostar todas as fichas em Gabriel, ele está nos deixando previsíveis, tentem não ser. Aloha!
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