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Foto do escritorRedação | Vision Surf |

30 anos depois de sua 1º vitória em Pipeline, Kelly vence de forma incontestável pela 8ª vez

Atualizado: 7 de fev. de 2022


Como disse um tricampeão mundial em entrevista a Vision, existem dias que você sabe que nada vai dar errado. Algo me faz crer que ontem foi um desses dias para o maior surfista que a humanidade conheceu, em matéria anterior sobre Pipeline nós dissemos aqui: A intimidade com aquele lineup favorece a Kelly, as condições do mar favorecem a Kelly, a experiência favorece a Kelly, a idolatria da areia favorece a Kelly, algumas ausências favorecem a Kelly, tudo favorece a mente vencedora de Kelly Slater, resta agora ele organizar tudo isso em sua mente e emplacar mais uma mágica, vencer Pipeline aos 50 anos, nos últimos anos ele nunca teve uma chance tão clara e ele sabe disso, Kelly é uma máquina perfeita de competição, não duvidem.

Poucos dias depois aqui estamos nós, Kelly venceu, mas antes de falarmos da quinquagésima sexta vitória do GOAT, sua oitava vitória em Pipeline, trinta anos depois de seu primeiro triunfo na rainha de Oahu, é preciso falar de alguns personagens.

João Chianca - Foto: Tony Heff

Em mais de 35 anos acompanhando o surfe mundial nunca vi um estreante surfar com tanta propriedade, causar tanta admiração mundo à fora e promover o espetáculo como João Chianca fez em Pipeline, nem mesmo o estreante Gabriel Medina no longínquo 2011, que dentre tantos outros nomes venceu Shane “BackDorian”, até sucumbir à imponência do campeão da etapa, o australiano Kieren Perrow. Chianca não se importou com seus adversários, venceu o cara que fez a melhor apresentação no primeiro dia, Jack Robinson se quer teve tempo de raciocinar de onde partiu o chumbo que o derrubou, contra John John ele mandou o recado típico do moleque que é, mesmo depois do havaiano marcar aquilo que seria a maior nota da competição até o momento, Chianca foi lá e sem demostrar nenhum esforço ou qualquer outra expressão que se assemelhe a dificuldade, fez de fato aquilo que ao final da competição se confirmou como a maior nota do evento, 9.87, o garoto demonstrou um grau tão grande de intimidade com Pipeline que nos fez acreditar que existe ali um caso de amor antigo, contudo ele nem tem idade para que alguma coisa seja antiga em sua vida, Chianca chegou em Pipe como uma expectativa, saiu como uma realidade, chegou com ares de gente grande, está saindo incontestavelmente como um gigante, o garoto impôs muito respeito em um lugar onde performance constrói uma reputação mais sólida do que muitos títulos. Sem mais.

John John é um monstro, ele e Gabriel estão em um patamar acima de todo o resto, contudo, algumas vezes somos induzidos a sentir um certo “nojinho” dele sem que ele faça absolutamente nada para isso, a subjetividade do julgamento alimenta esse sentimento cruel, errático e torpe, ainda assim ele continua sendo um monstro, mas nas paragens do North Shore, no confronto dos locais, quis os Deuses do surfe que Seth Moniz representasse-os, o filho do Legend Tony Moniz já começou fazendo a onda que ao meu ver foi a mais difícil da competição, onda grande, air drop, correção de direção dentro do tubo, três seções de lip grosso vencidas e uma recompensa de 9.60, foi justo, muito justo, justíssimo. Na bateria seguinte Seth triunfou sobre Caio, que fez seu melhor resultado em Pipeline surfando como convidado, para a sorte de Seth, Strider não tinha parafina para emprestar a Caio, isso poderia ter mudado o rumo da competição, brincadeiras à parte, Caio parou, Seth avançou.

Miguel Pupo - Foto: Brent Bielmann

Samuel Pupo ficou com o melhor resultado entre os estreantes, o garoto surfou muito discretamente toda a competição, a exceção foi a bateria que ele eliminou o gigante Jordy Smith, já seu irmão Miguel conseguiu o equilíbrio perfeito entre o potencial de seu surfe e resultados condizentes, depois de sete anos, desde a etapa da Gold Coast em 2015 quando ele perdeu para Julian Wilson, Miguel voltou a figurar em uma semifinal de etapa do CT, uma semifinal polemica, depois de dez minutos sem pegar nenhuma onda, Miguel e Kelly decidiram remar na mesma onda, ela tinha possibilidade para os dois lados, a experiência de Kelly venceu a vontade de Miguel que cometeu uma interferência claríssima, caso essa interferência não existisse, Miguel seria o finalista, mas ontem era dia de Kelly. Maktub.

O maior surfista que a humanidade conheceu não é simplesmente um cara com um talento fora da curva, ele é o cara que submete esse talento a uma força superior e dominativa, sua mente. Na semana em que completa 50 anos, Kelly Slater venceu pela oitava vez em Pipeline, uma onda tão desafiadora quanto as metas impostas pela mente de alguém que está há 30 anos no topo de esporte. Quando venceu Barron Mamiya, um dos mais talentosos surfistas em ondas tubulares, faltando apenas quatro segundos para o final da bateria, Kelly olhou para o xadrez competitivo e percebeu que cinco anos após sua última vitória, havia aparecido a chance mais clara dele vencer novamente. Kelly não é alguém que esquece facilmente suas derrotas, aliás, ele se alimenta delas, por isso, ontem na primeira bateria do dia Kanoa Igarahi foi defenestrado pelo careca, o japonês havia vencido Kelly naquele lineup em 2016 surfando em condições muito amenas, nas condições de 2022 Kelly não daria a mínima chance a ele, e assim fez. Miguel seria naturalmente um adversário duro, contudo a experiência de Kelly ao impor a Miguel uma interferência logo na primeira onda da bateria mudou todo o schedule do confronto e permitiu que Kelly usasse o tempo da bateria a seu favor, poupando-se fisicamente para a final.

Kelly Slater - Foto: Tony Heff

No confronto final Kelly Slater deixou ainda mais claro o quanto ele é um alien, enquanto em sua primeira onda Seth Moniz de 24 anos demonstrava exaustão por estar competindo sua terceira bateria do dia, parecendo estar lutando para dar significado à sua primeira final, Kelly de 50 anos remava como um garoto em busca de sua melhor apresentação, ele mostrava toda sua técnica, suas linhas inteligentes, agressivas e profundas para o Backdoor, Seth parecia travar um embate com a mãe natureza, Kelly era simplesmente conexão, espirito, complemento, o surf em sua forma mais pura, o GOAT não se esforçou para somar 18.77 (9+9.77), para vencer um garoto com idade de ser seu filho, alguém que quando nasceu, já encontrou um mundo onde Kelly Slater era tetra campeão mundial.

Kelly e Seth - Foto: Brent Bielmann

“Isso é espiritual para mim, é difícil de descrever”, disse Kelly, com os olhos marejados, acho que neste momento não apenas ele, “Esta é a melhor vitória da minha carreira”, “Dediquei minha vida inteira a isso”.

Todos os esportes tem um rei, o surfe tem um Deus, uma entidade que por mais que esqueçamos, ele se faz presente e nos faz perceber o quão poderoso ele é, o quão infinito é sua força, o quão firme ele é em seus propósitos, o quão grandioso ele é em seu exemplo. Nossa maior fraqueza está em desistir, o caminho mais certo para vencer é tentar a exaustão, embora Kelly não precisasse provar mais nada para ninguém, ele tentou e conseguiu.

Há um ditado que diz: Não há fatos eternos, como não há verdades absolutas. Eu ouso a dizer que a exceção é Kelly Slater.


Kelly Slater - Foto: Brady Lawrence

Após a vitória de Pipeline abre-se um novo panorama para Kelly, pela primeira vez ele vai usar a lycra amarela, aquela que determina o líder do ranking, depois de vencer Pipeline pela oitava vez há quem acredite que ele vai se retirar, particularmente falando, eu acho que essa vitória alimentou o sonho pelo qual ele vem prolongando sua carreira, o desejo de seu décimo segundo título. Se Kelly continuar, próxima etapa é Sunset, local onde ele jamais venceu, em sua mente isso se impõe como mais um desafio a ser vencido, se ele for bem lá, há quem acredite que é possível até que ele se vacine para ir à Austrália, e assim chegar em condições de ser top cinco ao final da temporada.

Como podemos ver a vitória de Kelly trouxe várias incertezas, a única certeza de tudo isso é que o maior surfista que a humanidade conheceu continua a nos surpreender mesmo depois de 31 anos competindo, ele é um Deus do passado, do presente e para todo o sempre, amém!

Obrigado por tudo Robert Kelly Slater, foi lindo, foi grande, foi exemplo!

Até Sunset!


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